Dizem que águas passadas não movem moinhos. É uma grande verdade. Em certas circunstâncias, contudo, não é bem assim. Se a calha, lá embaixo, entope, por alguma razão, a água que desce vai formando um lago. Se subir bastante, cobre o moinho. Ele fica submerso, desaparece. Forma-se outra corrente.Vai escoar para outro lugar, não se sabe onde.
Pode parecer complicado, sem sentido. Mas isso mostra que toda regra pode ter exceções. O inesperado acontece. Se transferirmos para a política, a lição é que nem sempre as coisas acontecem como se espera.
Razão para ter mais cuidado. Pensar melhor no que se faz e se diz. O que se vê, agora, é que muita gente teve que engolir de volta o que disse. Alguns, fazem isso sem vergonha. Tipo FHC, que foi visitar o Lula, com frases elogiosas, abraços e sorrisos. O Lula gostou, obviamente, qualquer apoio agora é importante. O Fernando Henrique mudou o tom, virada de 180 graus, como se nada tivesse acontecido nestes últimos anos. Esse é só o caso mais emblemático. Houve outros, igualmente interessantes.
Quase todos os ex-presidentes do PSDB também viraram. Declarações de apoio ao Lula se multiplicam. De gente do PDT, até do MDB. O importante ministro do Temer, que o empurrou para o impeachment, fez parte do governo golpista até o fim, também aderiu. Nem vou falar do rapaz de Pinda, tornado cearense, que deu uma fala meio confusa, não mencionou nome, mas parece que apoiou o candidato do PT. Ainda bem. Tudo isso é bom, quanto mais melhor, chega na hora certa.
A verdade é que todas essas divisões, que estão se dissolvendo, virando união, não faziam muito sentido. Houve um tempo que o PSDB sentia simpatia, o pessoal do partido chegou a votar no PT. Havia acordos, alguns desacordos, mas o clima era mais ou menos civilizado. Éramos todos brasileiros, queríamos avançar, discutia-se o método, onde por esta ou aquela prioridade, com qual ênfase. Sabendo que todos os planos e desejos naufragam quando surge uma emergência, problema que vem de fora e nos afeta, força redirecionamento. Por aí vai.
Nada havia de profundamente errado, nessas divisões e coincidências, apenas a grande determinante em política, a sede de poder. O desespero dos tucanos começou com a reeleição da Dilma. Se assim continuasse, PT ganhava pra sempre. Foi então que houve o grande racha. O PSDB se juntou ao pior. Abandonou seus princípios, até os de governabilidade. Não aceitou os resultados da reeleição. Sem nada conseguir com isso, resolveu torpedear o governo dela, com as chamadas pautas bombas. Aprovavam projetos que estouravam o orçamento, descontrolava tudo, virou um horror.
Quando se descobriu crime de Aécio Neves, que tinha sido o candidato opositor de Dilma, até os cabeças brancas do partido dele barraram a licença para processá-lo. Tudo isso preparou o clima da o impeachment. Que aconteceu, desembocou no governo desastrado do Michel Temer. O tal que começou a derrubar as velhas conquistas dos trabalhadores, que tinham começado no tempo de Getúlio Vargas. O mesmo que mudou também a política de preços da Petrobras, que faz brasileiros pagarem preços internacionais pelo combustível extraído e refinado em território brasileiro.
O Temer e o PSDB prepararam a cama para Jair Messias. Que completou a obra, desmanchando as nossas melhores instituições. Da educação à saúde, passando pelo meio ambiente, Jair foi devastando. É isso o que ele promete agora. Mais do mesmo: devastação, armas, milícias, brigas com os vizinhos, que estavam muito amigos e eram bons parceiros.Brigou também com aliados de fora. Provocou, gratuitamente, por birra ignorante, até o presidente da França, disse que a mulher dele era feia.
Esse rapaz não serve para esse cargo, Não merece reeleição. O PSDB percebeu, deu meia volta. A maior parte do PDT também. Isso explica a dianteira que Lula leva em relação a Jair. É uma reavaliação prudente. As circunstâncias ficaram tão graves que forçam uma mudança.
O caso dos economistas do PSDB foi emblemático. Aderiram ao Lula, em bloco. Há juízo, ali. Perceberam que não é mais hora de detalhes, divergências que no fundo não mudam tanto. Nada disso é importante quando o presidente e seu grupo mostram o desejo de simplesmente destruir, vender tudo por quanto quiserem dar, entregar os anéis, os dedos, os braços inteiros. Decidiram que, aí, não dá. Ha que erigir alguma barreira, podem até ganhar algum dinheiro se a farra for completa, mas isso compromete demais o futuro, até dos filhos e netos, o país vai para o beleléu.
Nem esse juízo, mudança prudente, aparece nos casos em que os políticos são apenas oportunistas, absolutamente sem princípios, com cérebro faltante. É o caso do prefeito de São Paulo, um joão ninguém, do governador do mesmo estado, que se revela um desclassificado, ou o governador gaúcho, que resolve ficar neutro, numa hora dessas.
O que sobrou do pessoal do Ciro, já órfão, deserdado, continua batendo na mesma tecla. Fala das alianças espúrias, exatamente aquelas que o líder deles tentou sem sucesso porque ninguém confiava mais nele. Mas isso não faz música, não perceberam que o buraco é mais embaixo.
O que tudo isso mostra é que se quisermos continuar com o país inteiro, com um mínimo de paz, há que juntar todos, a despeito de tudo o que nos divide. Estamos no planeta Terra, isto aqui não é Marte, há que ser realistas. Temos que encontrar um jeito de trabalhar com o que temos. Fazer disto um país decente não é obra de vestais, todas de branco, puras, num convento, no meio de nada. Nem de grupelhos que acham que só a solução deles existe, que a bola é deles e que se não quiserem jogar eles levam a bola, saem emburrados.
O país é grande. Há uma multidão de interesses, muitas vezes conflitantes, todos se consideram legítimos. No meio de tudo isso é indispensável uma direção que assegure um caminho, que todos possam trilhar. É nessas horas que, se houver sorte, surgem líderes que percebem. São eles que fazem o país dar certo.
Esse é o quadro agora. A situação é complexa. Tem o que aponta para algo viável, que convém à maioria. Outro aponta para o buraco.
Muitas águas passaram. O rio não é mais o mesmo. Há que pensar de novo por onde seguir. Nada é perfeito. Mas, certamente, um é melhor.
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