Estamos a menos de três semanas do segundo turno. Vinte dias, para ser mais preciso, pouco tempo para uma decisão tão importante, muito tempo para que a decisão aconteça de uma vez. Paradoxos da ansiedade.
A realidade é que é a eleição mais crítica que eu me lembre. E olha que meu
primeiro voto foi em 1968 para Vereador em Porto Alegre, pois vivia-se na
ditadura e os prefeitos das capitais, bem como das consideradas Áreas de
Segurança Nacional, eram indicados.
O povo que ficasse em seu lugar de financiador de ditadores e não se metesse a
besta. Quem decidia o que era melhor pra ele eram os militares sabe-tudo. E só
pra colocar na linha do tempo, essa eleição aconteceu a menos de um mês da decretação
do tristemente famoso AI5.
Pois bem, mesmo assim vejo que a escolha desse segundo turno é mais decisiva do
que a de meio século atrás.
A de então era um simulacro, sargento (os que sobraram) era
autoridade, general então um semideus. Alguns até deuses completos, donos das
vontades e liberdades alheias.
É disso o que o tal Jair sente falta. Ainda não era o oficial bunda-suja,
apenas um moleque idem. Mas é saudoso do que não viveu, apenas imagina-se agora
como comandante supremo dessa bagaça.
Assim como o Jair de hoje, os marechais de então se rotulavam cumpridores da
lei e defensores da democracia. Não sei até agora se por cinismo ou ignorância.
Do Jair eu sei, os dois.
Por isso essa eleição é mais crítica.
No modelo de golpe institucional e não militar, adotado por Hitler, aperfeiçoado
por Chavez e hoje adaptado por alguns tiranetes, como da Hungria, Polônia
Rússia, Ucrânia, Turquia mais ou menos, surge a tirania fantasiada de
democracia. Por meio de ferramentas democráticas desenham-se as tiranias, com
maior ou menor grau de truculência.
Alguém pode afirmar que esses rapazes não foram eleitos? E que as reformas que
instrumentalizaram os órgãos de Estado não foram aprovadas pelos respectivos
Congressos?
E que as Supremas Cortes, com efetivo ampliado para assegurar alinhamento
majoritário ao governante, não validaram juridicamente sua descaracterização?
É isso o que o tal Jair daqui já anunciou que fará se eleito.
Seus primeiros quatro anos foram para demolição institucional. Quer os próximos
quatro para construir a nova ordem, desenhada conforme o gabarito tirânico
desejado
Acontece que o tal Jair, tosco, ignorante e atrapalhado, é
mero fantoche dos marechais.
Esses sim com saudade das trevas, dos seus tempos de tenente ou capitão com a
autoridade e estatura de salvadores da pátria. Esses é que pretendem reviver os
velhos tempos saudosos de glória, colocar o Brasil no que eles imaginam ser os trilhos
ensinados por economistas neoliberais anacrônicos.
Por isso tudo é que o segundo turno é decisivo para a própria sobrevivência
soberana do Brasil.
Se ganha o fantoche em nome dos marechais, sendo que já há
um deles, menos abobalhado que o anterior, adredemente colocado para substituir o
fantoche caso necessário, resistirá o Brasil por mais quatro anos
internacionalizando seus recursos, ignorando a rede de proteção social aos mais
carentes, acabando com a educação e saúde públicas, instrumentalizando as
instituições para agirem de forma servil ao poder?
Os próximos quatro anos decidirão se há ou não futuro para o Brasil.
A escolha é simples. É entre democracia e tirania, liberdade e arbítrio,
segurança ou ameaça, soberania ou servilismo, solidariedade ou egoísmo,
inclusão ou exclusão, preservação ou destruição.
Não são escolhas formais de métodos a serem adotados. São sobre valores
antagônicos.
Muita gente ainda não percebe a real dimensão dessa escolha. Nem todo mundo é
mau caráter, nem traidor e aproveitador, que pouco se importa desde que leve
vantagem.
Há também o ingênuo iludido, o alienado bem intencionado, o revoltado sem causa
definida, por ouvir falar. Há de tudo, antolhos e olhos vendados, simples
escuridão.
Mostrar a realidade na caverna de Platão, eis o grande desafio.
Comentários
Postar um comentário